Responsabilidades Corporativas - Do Conselheiro ao Estagiário são uma Equipe, por Ricardo Negreiros

Meu diploma de 1985 como Engenheiro Civil, em Cálculo Estrutural, não me dá condição de explicar tecnicamente as tragédias de Mariana, Brumadinho e menos ainda as quedas dos aviões Boeing 737 MAX na Indonésia e Etiópia. Mas ao imaginar a agonia que centenas de inocentes sofreram enquanto morriam, e a dor dos que os amavam, acredito que poderiam ter sido evitadas, caso as empresas funcionassem de certa forma. É com essa perspectiva que desenvolvo este ensaio.
A pergunta que pretendo responder é: como analisar a responsabilidade (ou culpa) sobre acidentes, erros e irregularidades em um produto ou indústria, ao examinarmos a intrincada rede de relacionamentos, escopos e responsabilidades das atividades corporativas?
Minha primeira preocupação num projeto de reestruturação é definir o organograma funcional. Essa ferramenta permite esboçar o funcionamento esquemático da empresa a partir de:
1. Delimitação dos escopos e responsabilidades – quem é o “pai” ou a “mãe da criança”? Não pode sobrar nenhuma tarefa, processo ou atividade sem que haja um responsável consciente de seu papel.
2. Estabelecimento da linha de comando – quem é responsável por quem? Quem presta contas a quem? Como e quando chefes e subordinados são formalmente avaliados?
3. Indicativo da relação “cliente x fornecedor” na estrutura – uma área ou departamento pode ser considerada cliente de outra área ou departamento e vice-versa. Exemplo: o DP (departamento de pessoal) é cliente do PCP (planejamento e controle de produção) pois precisa receber deste os apontamentos das horas extras da fábrica. A posição inverte quando ao final do mês o DP precisa enviar ao “cliente” PCP os contracheques dos operários.
Não pretendo aqui me estender muito além desses comentários e do que este organograma simplificado podem fornecer, pois são elementos do cotidiano das empresas de conhecimento do estimado leitor por familiaridade profissional e seu próprio poder de observação.
No entanto, o que gostaria de chamar à atenção é que muitos gestores, por distração, conveniência ou mesmo orgulho de suas posições, parecem não se dar conta que o único grupo de indivíduos que não tem responsabilidade direta pelo desempenho geral do negócio e pelo que nele acontece é o acionista. Sua única e principal tarefa é capitalizar o empreendimento e cobrar que todos os contratados, dos conselheiros aos mais iniciantes estagiários, trabalhem juntos, de forma corresponsável, em equipe, e produzam o melhor resultado do ponto de vista da lucratividade e da perenização das operações. Todo e qualquer profissional da empresa, inclusive os conselheiros, presta contas para alguém acima e, quando em cargo de chefia, tem ainda a obrigação adicional de motivar e desenvolver profissionalmente os que estão sob o seu comando.
Logo, se um operário sofre um acidente na fábrica, os primeiros responsáveis são ele mesmo e seu coordenador direto; o gerente que os contratou e que é pago para os supervisionar; o diretor que os contratou e que é pago para os gerenciar; o presidente e, por fim, os conselheiros que os contrataram. Da mesma forma, um produto que não funciona a ponto de oferecer riscos ao consumidor, os responsáveis são todos da linha de comando dos envolvidos, a começar pelo mais alto escalão. Essa visão, associada a ferramentas de avaliação de desempenho geral, funcionam como um controle de qualidade (CQ) de toda a estrutura, assim como é indispensável um CQ na área fabril.
Os componentes do Conselho de Administração são responsáveis por contratar adequadamente os principais executivos mas, principalmente, por assegurar uma discussão profunda do que acontece na empresa. É imprescindível que a monitorem por meio de reuniões regulares com o presidente e a diretoria, os quais apresentam relatórios sistemáticos e abrangentes quanto a todos os aspectos do desempenho e da evolução dos negócios. Mas também são responsáveis por estabelecer uma cultura de cuidados sobre o que possa resultar em risco de capital, lucratividade ou imagem da empresa. Devem, portanto, instituir a consciência do zelo e respeito à vida, acima de tudo, inclusive porque é o tipo de descuido com maior potencial de afetar o resultado e a continuidade das operações.
Em suma, o Conselho de Administração de uma empresa precisa ter valores éticos, competência técnica e vitalidade para enxergar além do que lhes é trazido para discussão, por profissionais igualmente hábeis e aptos para, juntos, administrarem adequadamente o empreendimento, satisfazendo o que lhes foi demandado e contratado pelos acionistas.
Com senso de equipe.

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